terça-feira, 22 de abril de 2008

Ela atravessou o corredor numa velocidade impressionante. Era noite e as luzes estavam desligadas, a casa adormecida. Só era possível ouvir com clareza seus próprios passos e gestos. O silêncio era a sua barreira para andar pelo corredor, mas a quebra desse silêncio numa noite como aquela era bem pior. Ela sentia o suor frio na nuca enquanto as horas passavam, sem conseguir pegar no sono.
Depois que andou todo o corredor escuro, quando finalmente chegou à cozinha, tateando o caminho a sua frente, não conseguiu sentir-se melhor. Mesmo depois de um copo de água muito gelada, que poderia ser um alívio. Naquela noite, aquilo era mais um banho gelado de realidade, que se misturava a suas ilusões de menina. Ilusão e realidade não combinam e muitas vezes isso acontecia e ela não sabia se optava em ser o que era antes do banho ou se continuava alerta. Quanto mais o tempo passava, mais a vida real caía sobre a garota. O broto, o pequeno sinal de vida, estava se confundindo com a rosa aberta e exuberante.
Algum tempo depois, ainda no escuro, lembrou que se continuasse acordada não conseguiria acordar cedo no outro dia. Mas, pela primeira vez na vida, esqueceu essa lembrança e junto ao seu devaneio, veio uma súbita vontade de esquecer de tudo o mais que a estivesse impedindo de conseguir atravessar um corredor escuro ou que a fizesse temer a realidade e os sonhos.
Finalmente, resolveu dormir, porque o sono havia chegado e disso ela não fugiria. Atravessou o corredor percorrendo o mesmo trajeto, agora com outro semblante e outra postura; entrou no quarto e ao deitar-se pensou porque ela simplesmente não acendeu as luzes da casa para que tudo se resolvesse mais rápido. Depois percebeu que não seria preciso fazer isso, porque as luzes estavam acesas dentro dela, ela só precisava enxergar isso e as coisas acabariam bem; a vida estava ali para ser vivida e não para ser planejada a cada minuto. E enquanto ria de tudo isso, era embalada em seus pensamentos por um mundo de sonhos e emoções, e sentia uma sensação gelada e agradável na boca. Assim, adormeceu.

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